Muito antes de academias, cordas, graduações e uniformes padronizados, a capoeira já pulsava como forma de organização social, resistência e identidade coletiva. No Rio de Janeiro do século XIX, em um período marcado pela escravidão, repressão e criminalização das expressões culturais negras, os capoeiras se estruturavam em maltas grupos organizados que iam muito além da luta corporal.
As maltas funcionavam como verdadeiras redes de proteção e pertencimento. Entre as mais conhecidas estavam os Nagoas e os Guaiamuns, que dominavam territórios específicos da cidade, possuíam cores, símbolos e códigos próprios e mantinham uma rígida lealdade entre seus integrantes. Em uma sociedade que perseguia corpos negros, essas organizações garantiam apoio mútuo, defesa e afirmação cultural.
Cada malta tinha sua própria linguagem, estratégias de atuação e formas de reconhecimento. A capoeira, nesse contexto, não era apenas um jogo ou uma técnica de combate, mas uma ferramenta de sobrevivência coletiva. Era também um meio de comunicação, de resistência política e de construção de identidade em meio à exclusão social.
A repressão policial e as leis que criminalizavam a capoeira tentaram apagar essa história, mas não conseguiram silenciar sua força. Pelo contrário: a arte se reinventou ao longo do tempo, atravessou gerações e hoje é reconhecida como patrimônio cultural, dentro e fora do Brasil.
Entender o papel das maltas é compreender que a capoeira sempre foi mais do que movimento. Ela nasceu como organização social, como expressão de luta e como símbolo de resistência negra. Por isso, quem conhece suas raízes não apenas joga capoeira joga com consciência, história e identidade.
A capoeira segue viva, carregando em cada ginga a memória de um povo que transformou opressão em cultura, perseguição em estratégia e luta em arte.

